Em junho de 2024, o governo federal editou a Medida Provisória (MP) nº 1.227, com o objetivo de compensar os impactos financeiros da desoneração da folha de pagamentos de empresas e municípios. Essa MP impôs restrições significativas à compensação de créditos de PIS/Pasep e Cofins, limitando o uso desses créditos para abater apenas os próprios tributos e não outros impostos, como anteriormente permitido. Essa mudança visava aumentar a arrecadação do governo em cerca de R$ 29,2 bilhões para equilibrar as contas públicas após a prorrogação da desoneração da folha de pagamento até 2027.
Henrique Rodrigues, especialista em reciclagem animal da Aboissa, explicou que, desde 2023, o governo tem tentado cortar incentivos fiscais que produtores de biodiesel sempre tiveram. Esses incentivos permitiam que os produtores se creditassem dos valores de PIS, Cofins e ICMS pagos na aquisição de insumos, reduzindo o impacto desses impostos sobre seus custos operacionais. Contudo, com a MP, esses créditos foram limitados, impactando diretamente a competitividade e a lucratividade dos produtores de biodiesel.
No setor do agronegócio, a medida causou preocupação significativa. O fim dos créditos presumidos de PIS e Cofins, que antes ajudavam a reduzir os custos de produção, deve resultar em um aumento dos custos operacionais. Por exemplo, a soja, uma das principais commodities do Brasil, deveria sofrer um aumento no preço de venda devido à incapacidade dos produtores de compensar os créditos como faziam anteriormente. Isso significa que os produtores poderiam ter uma redução direta na renda. Ademais, os fornecedores de matérias-primas para o biodiesel veriam seus preços reduzidos. Todo o esforço empenhado para alcançar preços elevados seria desfeito, uma vez que o biodiesel não contaria mais com créditos, mas apenas com custos adicionais. Consequentemente, os vendedores de matérias-primas tenderiam a se direcionar para outros setores que demandam esses insumos.
Impactos nas exportações
A MP também afetaria as exportações do agronegócio, já que impede a utilização dos créditos de PIS/Cofins que as empresas exportadoras acumulam naturalmente. Isso oneraria as exportações, prejudicando a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional. Alan Un Cho, analista financeiro da Aboissa, comentou que “Ao impedir a compensação ou o ressarcimento desses créditos tributários, a MP aumenta a carga tributária das empresas, elevando consequentemente os seus custos de produção. Diante desse aumento, o produtor pode optar por elevar os preços caso identifique essa possibilidade no mercado, repassando o aumento da carga tributária aos consumidores finais, tornando seu produto menos competitivo no cenário internacional. Caso contrário, o produtor precisará reduzir suas expectativas devido à diminuição da margem de lucro.”
Ponto positivo:
- Aumento da arrecadação: O governo espera arrecadar mais impostos, o que pode ser revertido em investimentos em projetos ambientais e outros setores essenciais.
Pontos negativos:
- Impacto nos custos de produção: A eliminação dos créditos aumenta os custos para os produtores de biodiesel e outros setores do agronegócio. Isto reduz a competitividade no mercado interno e internacional, como exemplificado pela recente decisão da China de comprar soja dos EUA em resposta às mudanças nas regras do PIS/Cofins.
- Risco para a sustentabilidade: A medida pode reduzir a produção de biodiesel, contrariando esforços governamentais para posicionar o Brasil como referência no mercado verde.
Reação do mercado
A reação do setor produtivo foi rápida e contundente. Entidades como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) expressaram forte oposição, argumentando que a MP poderia causar grandes prejuízos ao setor agropecuário. A medida foi temporariamente suspensa após mobilizações e negociações políticas, mas a incerteza permanece.
Heitor Pereira, especialista em óleo de palma da Aboissa, observou que “durante os dias em que a possibilidade da MP existiu, os negócios de óleo ficaram limitados à necessidade momentânea, e a maioria das empresas se retirou das compras. Sentimos um impacto muito negativo nas negociações de óleos. Em seguida, com o cancelamento (mesmo que temporário) da MP, as negociações voltaram a acontecer normalmente.”
Em resumo, a MP de PIS e Cofins de 2024 representa uma tentativa de reforma tributária com objetivos claros de simplificação e aumento da arrecadação. No entanto, seus efeitos sobre o agronegócio levantam preocupações significativas sobre a viabilidade econômica e a sustentabilidade ambiental dos produtores. A continuidade ou modificação dessa MP dependerá de negociações futuras no Congresso Nacional e da pressão exercida por diferentes setores da economia. Atualmente, a MP está suspensa, mas a situação ainda pode mudar dependendo das deliberações legislativas futuras.
Por Vanessa Ferreira